A spectre is haunting the Anthropocene. The spectre of the Caribou Man. Kanipinikassikueu, who abandons the world of men to marry a wild creature of the forest, and who becomes humanity’s shape-shifting go-between, ambassador to the deep woods. It is the Caribou Master who provides the hunter with his catch. If negotiated with, with respect.
In MC Bicho Bicha’s re-enactment of the story, the turncoat human seeks conjugal relations with Pachamama herself, the fecund plurality of nature. Collapsing into the embracing arms (and fronds and tentacles) of protean recreation in “Musica do Amor”.
Doesn’t every generation dream of overthrowing “civilization” and submitting to the call of the wild?
If so, Caribou Man speaks to us all.
“I’ve got a deer wife”, sang Momus, in his take on the myth. “Keep it to yourself”. But MC Bicho Bicha will not keep it to himself. He is potlatch incarnate. Gift economist. All the unaccounted and unaccountable transactions and reciprocations that humanity ignores in its rationally rapacious consumption of the forest. He sees the invisible debts that humanity is blind to.
And now, the Caribou Man is angry.
Contemplating the eco-apocalypse, as even life-giving water turns hostile in “Dono de Cemetario”, the self-declared queer animal, post-human, Jake Sully, calls us to a metaphysical insurgency against the evils of humanity, even taxonomy itself. In “Santo-Antonio Trilobita” he summons an army of animated Shoggothian mis-shapes. A courageous carnival of animal hybrids to stand firm and reprimand us.
At first listen, hip-hop, a genre of urban techno-culture and media assault, seems an odd counterpart for the mythological and symbolist poetry of Bicho Bicha’s forest-rooted guerrilla warfare. But hip-hop has always been a music of the oppressed and of its resistance. Nevertheless, the tension is made audible here. The flowing rhythms of MC Bicho Bicha’s poetry do not submit easily to mechanized beats. Rushing ahead or falling behind as the natural timing of the words overcomes the pummelling drums. The sound-world itself is in conflict, as harsh electronic sounds struggle against samples of birdsong and animal calls. Beats are heavy and loud, but break down in the face of equally strident lamentations. Bright, synthetic tunes seem to try to lure us back to the shiny human world, only to be subverted by Bicho Bicha’s more subtle quivering melodies.
Lyrics
1. Essa mina, a Pachamama
O poder da bicha
É o poder do bicho
Do bicho que devora quieto
Do bicho papo reto
Do bicho que se entrega
Tuas feras soltas, tuas asas
Teus ciscos, teus rabiscos.
O poder do que cresce no lixo,
do carrapicho
do teu mijo
O poder do bicho bicha
É o poder larval
Que te seduz, como um animal
Que te desmonta
Não segura tuas pontas
Te afronta, te deixa tonta
Te espicha a salsicha
Te esguicha
Até que cai a ficha
Nem tenho filo nem espécie,
Só bicha. Como todos os bichos
Concentrados num só animal
O filho da terra
Que não quer ser só
mais um mano humano
Devastador.
Chama a mina colorida
Que é feroz e graciosa
A mina que é a pachamama,
É condor, serpente e llama
Peixe, girino, iguana
Tragédia, piada, melodrama
Cupim, pernilongo, grama
É uma mina americana
Mais nativa que o Obama
pode mais do que a dinheirama
Que o papa e o dalai-lama
Chega junto, te inflama
E não fica cercada, fechada,
Amordaçada, domesticada, encurralada,
Apertada, silenciada, atropelada
Que ela não é só natureza, morou?
Que é só coisa do IBAMA
Ela quebra a cama
Essa mina, a pachamama.
e eu sou seu chifre caribu, dadivosa
Que eu sou homem-viado
O mestre das renas doces
Que se entregam aos caçadores
Que agradecem no jantar
Que este aqui é o meu planeta, vagabundo
E pra comer tem que pagar
Não com o dinheiro do açougue, filé
Mas com a carne do teu bucho
E a ossada que você usa, mané
Pra te sustentar – Caribuuuuuu
O barulho é o som da terra, mano
O noise da lava, da água, do fogo, do chão. Da terra que não se compra
Nem se arrenda a prestação
É a nostalgia da onça,
Do onça, do pato, da cabra, do porco
Do mato, do tronco, da seiva, do lago. Da cinza, do cobre, da lata,
do lítio, do estanho, do aço, do ouro nas moedas de um milhão.
A nostalgia dos processos indisciplinados
Nas máquinas que industriais engravatados
Entregam aos somalis escravizados
Que ficam milhões de horas encalacrados
No chão da fábrica amarelado
Fazendo lucro camuflado
Vendidos por outro imigrante proletarizado
Que largou de ser um bakuníndio
Pra rodar a manivela do desejo líquido
nos tentáculos ávidos atávicos hiperbólicos
de Chluthlu.
Meu nome é ruptura,
É V de humanidade
É esquecer a espécie, parceiro
Quero som que faz teus osso requebrá
Geral enviadá, malandro revirá
Reprogramar teu travesseiro
Correr com os equezeiro
As nega colando velero
Misturada nos maloqueiro
E todos os batuqueiro
Montando açucareiro.
MC Bicho Bicha
Esse viadão assombração
É o homem-caribú
(dadivosa) lemebel
Que te oferece cerdo cru
Pra tu comer ou pra comer teu macucu
Não é umas reninha, é trucuçu
Onde tem bicho tem bicha, xará
Onde tem baba de carniça
tem terremoto n’teu angu.
2. Santo-Antônio Trilobita
A medida provisória diz assim:
tudo o que é humano é soberano
tudo o que é natural é bestial.
Mas algumas de nós somos corajosas:
as hidras bichas,
as perereca ekeka
os musgo lusco fusco,
os mineral antipatriarcal
os parasita troglodita,
os computador pastor
os escaravelho vaga-lume, as minhoca imperial.
As minas de ferro e bronze,
escalafobéticas e segredudas
que devoram ministério,
o traço da lesma pre-rafaelita
o cisco do esmo vulcânico
aquele hormônio verde tirânico
que de vez em quando te visita
santo-antônio trilobita, a fadinha caribú
os cú, docilizado, soltando espuma
a laia de Gaia }bis
a desumanidade dourando na praia }
e tu que não vêm por aqui,
besta da tua crueldade
estigma da tua fúria, tu sangrando
tu mortalóide, pactuado com a mandioca.
3. O dono do cemitério
Já o verme, este operário das ruínas
que o sangue podre das carnificinas
lambe e a vida em geral declara guerra
anda a espreitar meus olhos pra roê-los
e há de deixar-me apenas os cabelos
na frialdade inorgânica da terra.
Das Ge-Stell bestellt den Bestand.
Vem ver o último vagalume
Vem ver a última abelha
Vem ver a última onça morrer
A onça que bebeu água contaminada.
Como eu poderia lhe dizer que já não era eu
que poderia lhe caçar,
que também no balde de água
ao lado da tina,
que também na torneira do tanque,
e na poça de água que escorre do cano,
não há água.
Como eu poderia lhe contar que a água,
já não era água.
jMesmo com toda a nossa indiferença,
a água era minha e dela.
A água era a água que eu havia caçado.
Eu caçava a água do córrego
Eu caçava a água do balde
Eu caçava a água do rio
Eu caçava a água da bica
A água caçava ela, a água caçava eu.
4. Música de amor
Morrer como bicha, voar como a seda
morrer como bruxa, tocar a trombeta,
morrer como bicha, trocar de trombeta
morrer como bruxa, voar com a seda,
morrer como bicha.
Um caso de amor com um besouro e um espartilho e uma parede
trágico, embriagado
e ternura;
não quero saber de faze carreira
no setor comercial –
não quero beber apeirol.
Quero adornar minha demência
com um amor descomunal
passando o dedo do meio no rego
entre o rodapé e o chão
encostando um pedaço de lona azul
na minha samambaia,
sexy, sexy
tão provocante…
Mais próximos de Deus que eu.