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Dionysian Industrial Complex

CPLX 7 : River of Electrons – Rapunzel

River of Electrons retorna ao Dionysian Industrial Complex com um exercício de “ressurreição” de seu arquivo pessoal.

Chiptunes e referências de retro-computação são agora uma parte estabelecida da cena da música eletrônica, mas Rapunzel é um pouco diferente, como RoE explica: 

Estes pequenos esboços e exercícios foram compostos num BBC Micro usando o MuProc (Quicksilva Music Processor) quando eu era adolescente, nos anos 80. Por sorte eu mantive uma cópia dos disquetes daquela época e, ao encontrar um emulador para o BBC Micro que funcionava no meu navegador, foi realmente possível executar o software, reproduzir e resgatar essas músicas.

O fascínio para mim hoje, 30 anos depois, é tentar entender o indivíduo que os criou. Obviamente são esboços juvenis, experimentos ingênuos, com harmonia e contraponto inacabados e sem polimento. Mas o que me intriga hoje (e meio que me aterroriza) é a ambição. Isto é música feita em um software sem a barganha faustiana de looping, ou mesmo sem recursos simples como copiar e colar… Cada nota é tocada à mão e cada compasso é diferente. Os motivos são repetidos, mas ou devido à inépcia (tocar as notas erradas) ou ao design, eles evoluem e se transformam continuamente. O tempo se alonga e encolhe, as melodias são harmonizadas contra diferentes contra-melodias ou riffs.

Posso identificar as influências da música que ouvia na época, talvez mais claramente hoje do que reconheci então: uma mistura de fragmentos da minha formação musical clássica muito rudimentar; o synthpop minimalista dos anos 80, que eu ouvia diariamente; algumas melodias folclóricas plangentes; algumas cadências ligeiramente influenciadas pelo blues. Nada muito do tipo “música de videogame”. Na verdade, eu costumava jogar com a música desligada; na época havia pouco senso de música de videogame como um “gênero” ou algo que valesse a pena prestar atenção. Mas a maior influência de todas foi sem dúvida a música russa para balé. “Pássaro de Fogo”, de Stravinsky, e “Romeu e Julieta”, de Prokofiev, são os dois melhores exemplos da musica que eu escutava muito nessa época. E assim, a duvidosa ideia de escrever um balé baseado num conto popular parecia bastante natural, assim como o uso de breves e penetrantes motivos rítmicos.

Naquela época, eu era alheio ao que agora seria obviamente um absurdo: tentar fazer música de balé orquestral em um chip que comporta apenas três canais de ondas quadradas e um canal de ruído. Os sons são claramente duros, alta frequência com pouca variação de timbre. Para a atual gravação eu os executei através de alguns EQ, eco e reverb, para tornar o som um pouco mais doce e suave e menos cansativo de se ouvir. E o eco confere a tudo um leve brilho natalino.

Na verdade, o eco / reverb é provavelmente exagerado, mas eu decidi aplicar uniformemente um efeito em todo o álbum ao invés de tentar varia-lo em cada diferente parte. Este não é pra ser um novo remix / remaster ou recriação do original, mas uma renderização o mais neutra possível, apenas para deixar a peça um pouco mais palatável.

Finalmente, devo observar que cerca de 60% da música que apresento aqui foi explicitamente composta para o balé chamado “Rapunzel”; o resto são esboços da mesma época que parecem se encaixar no mesmo clima. Eu juntei os vários fragmentos para fazer o que começa a parecer um todo mais coerente. Então, isso é, de certa maneira, uma reconstrução moderna.

Ouvindo Rapunzel hoje, em 2018, parece uma música alienígena, de um passado distante e desconectado (mesmo que seja apenas um passado pessoal). Essa música é desconcertante porque ao mesmo tempo é muito parecida e muito diferente da nossa ideia de “musica de videogame”. A qualidade chiptune do som é inescapável, mas não há arpejos frenéticos, hiper-sequenciados, incrivelmente rápidos. Este não é o som dos ravers que usavam Nanoloop, como Droid-On. Nem mesmo a estética hipster glitch de, digamos, “Super Madrigal Brothers”.

Em vez disso, é romantismo ingênuo e melancólico. Uma música de lamentos deprimidos e tristes. O tema de uma menina (ou deusa solar) trancada em uma torre por uma bruxa (perversa ou apenas muito protetora?) é certamente a fantasia arquetípica do adolescente. Uma saga gótica e cheia de angústia.

Mas hoje notamos que também é um tema clássico do videogame dos anos 80. O que, afinal de contas, é a luta de Jumpman com Donkey Kong, ou a missão de Mario no Reino dos Cogumelos, senão uma atualização da alegoria medieval “Ataque ao Castelo do Amor”.

 

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